sábado, dezembro 11

Textos para site

Artistas se unem pela defesa de interesses comuns
O Estado de S. Paulo - 25/10/2004 - Por Redação

Carregando a fama de categoria das mais desunidas, profissionais da música só costumam se encontrar em estréia de show de medalhões e velórios. Sexta-feira, em reunião no Itaú Cultural, em São Paulo, cerca de 50 desses artistas demonstraram estar dispostos mais do que nunca a se unir por outro objetivo comum: a criação de uma agência nacional da música, com poder jurídico para negociar e defender seus interesses. "Temos a melhor música do mundo, não podemos nos deixar subvencionar. Nosso movimento é para que tomemos a rédea do nosso destino, não esperar que as decisões venham de cima", disse Ivan Lins, que comandou a reunião ao lado da letrista Cristina Saraiva e dos músicos Juca Novaes, Carlinhos Antunes e Dalmo Mota, presidente do Sindicato dos Músicos do Rio de Janeiro. Entre outros, participaram das três horas de reunião expoentes de diversas vertentes da MPB, como os cantores Sérgio Reis, Célia e Celma, Ná Ozzetti, Clara Becker, Paulo Ricardo; os compositores Chico Saraiva, Celso Viáfora, Théo de Barros e Eduardo Gudin; o produtor Pena Schmidt; os instrumentistas Léa Freire, Caíto Marcondes, André Mehmari, Amilton e Adilson Godoy. Lincoln Antônio e Carlos Zimbher representaram a Cooperativa de Música, uma iniciativa bem-sucedida em São Paulo que vem progredindo.
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MinC cria as Câmaras Setoriais
Folha de S. Paulo - 25/10/2004 - Por Redação

Com um evento hoje, às 14h30, na Cinemateca Brasileira (lgo. Senador Raul Cardoso, 133, Vila Clementino, São Paulo), o ministro da Cultura, Gilberto Gil, e o presidente da Funarte, Antonio Grassi, anunciam a criação das Câmaras Setoriais de Cultura. O MinC convidou entidades representativas dos segmentos envolvidos música, artes cênicas, artes plásticas, literatura, além de artistas e produtores culturais, para estarem presentes e participarem dos debates e apresentarem propostas.
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Uma das categorias menos organizadas do país esboça mobilização; ensino obrigatório em escolas e criminalização do jabá podem ser as prioridades; Ancinav da música não é consenso

Sílvio Crespo
www.culturaemercado.com.br
24/10/2004

Compositores, intérpretes e letristas estão procurando iniciar no país uma mobilização permanente para elaboração de uma política cultural para a música. Em 24 de setembro, um grupo de músicos liderados por Ivan Lins, Cristina Saraiva, Ana Terra, Dalmo Mota e Francis Hime reuniu-se com o presidente da Funarte (Fundação Nacional da Arte), Antonio Grassi, e o secretário-executivo do Ministério da Cultura, Juca Ferreira, e propôs a criação de uma agência reguladora para o mercado musical, que obedeceria a princípios análogos ao da Ancinav (Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual).

Na última sexta-feira (22), Ivan Lins e companhia organizaram uma reunião no Itaú Cultural, em São Paulo, em que compareceram cerca de 60 pessoas. A continuidade do debate se dará por meio de um fórum virtual e um fórum “palpável”, com encontros regulares. O objetivo é iniciar uma discussão dentro de uma categoria ainda pouco organizada, se comparada a setores como o teatro e o cinema.

“Aqui em São Paulo não teve no ano passado o ‘Cultura para Todos’?”, perguntou à platéia Cristina Saraiva, uma das organizadoras da mobilização no Rio de Janeiro. A resposta foi um murmúrio de dúvidas, e uma ou outra pessoa arriscando palpites: “você está falando daquele Fórum Cultural Mundial?”.

Não. Cristina se referia ao evento na Sala São Paulo —majestoso palácio de concertos paulistano—, amplamente divulgado na imprensa, que reuniu em junho de 2003 mais de mil artistas e outros profissionais do setor cultural para apresentar propostas de políticas públicas. Representantes dos governos federal, estadual e municipal estavam presentes e consideraram o evento uma amostra das demandas de política cultural da cidade.

Prioridades
Na reunião no Itaú Cultural, em que se encontravam músicos de várias tendências, alguns com histórica presença na mídia, como Sérgio Reis, a preocupação era também preparar a classe para a criação das câmaras setoriais, que o Ministério da Cultura anunciará nesta segunda (25).

Foram lançados no encontro dois objetivos, que podem vir a orientar a organização dos músicos: a criminalização do jabá e a obrigatoriedade do ensino de música nas escolas. A idéia de regulação do setor, quando posta em debate, rendeu polêmica e deve sair de pauta, a menos por enquanto. Não se falou em numeração de CDs, lei aprovada em 2002 com o objetivo de dar ao músico algum controle sobre suas vendas.


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Gil anuncia câmaras setoriais
Folha de S. Paulo - 26/10/2004

O ministro da Cultura, Gilberto Gil, anunciou ontem em São Paulo o lançamento de câmaras setoriais de cultura voltadas para música, artes cênicas, artes visuais e livro/leitura. Representantes dessas áreas reclamaram que o ministério estava dando prioridade à tentativa de criação da Ancinav (Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual). As quatro câmaras terão membros do governo e das respectivas áreas e serão vinculadas à pasta. O anúncio da composição será feito dentro de 15 dias aproximadamente. Segundo Gil, as câmaras terão seis meses para apresentar um projeto de políticas para cada setor e poderão se transformar em conselhos nacionais (como o Conselho Superior de Cinema) e até em agências. "Que venham agora quatro avalanches", afirmou Gil, comentando a avalanche de controvérsias geradas pelo anteprojeto da Ancinav

Suite e sequencia: música 2 - 01 nov Folha de SP
MÚSICA EM DEBATE

Artistas pedem inclusão de ensino musical em currículo escolar e atuação do governo contra jabaculê

Jabá e direito autoral mobilizam classe
DO ENVIADO AO RIO

Embora a incerteza e a hesitação ainda dominem as discussões da classe musical recém-reagrupada, parece consensual a proposta de que se criem diversos grupos de trabalho para levantar os principais problemas atuais do setor no Brasil e levá-los ao Ministério da Cultura.
A proposta inicial dos organizadores elenca dez grupos: de educação musical, capacitação profissional, meios de comunicação, difusão de música brasileira no exterior, preservação de memória, pirataria, direitos autorais, mapeamento, criação e formação de platéia e questões trabalhistas.
A dinâmica se acelera, Fernanda Abreu pede inscrição no grupo de direitos autorais. Jorge Vercilo reivindica a inclusão de grupo para a atividade dos músicos da noite ("em que sobrevivi muitos anos e ainda sobrevivo"); convencido, acaba inscrito no grupo trabalhista. Ivan Lins se autofilia ao dos meios de comunicação, em que a vedete será o famigerado jabaculê (pagamento de dinheiro por gravadoras para determinadas músicas estourarem em rádio e TV).
A compositora Joyce, da platéia, discursa pedindo especial atenção a três questões: a luta contra o jabá, a inclusão do ensino de música na formação escolar básica e a necessidade de extinguir a maioria das sociedades de arrecadação de direitos autorais no país.
Sobre esse último ponto, ela e outros participantes atacam a proliferação de sociedades subordinadas ao Escritório Central de Arrecadação de Direitos (Ecad) nas últimas décadas, enquanto países mais desenvolvidos possuem uma ou duas organizações.
Sobre o jabá, Joyce pede que a classe pressione firmemente o governo e o Ministério da Cultura: "É questão de corrupção, se neguinho está detonando briga de galo por que não encarar o jabá?".
Os direitos autorais também dominam a pauta, como na intervenção do compositor e guitarrista Cláudio Guimarães: "O Ecad é um entulho autoritário, quando lutamos por sua criação era a única luz no fim do túnel. Era bandidagem, Jards Macalé tomava tiro na rua por falar do assunto".
Lembrando a movimentação dos anos 70 que culminou na criação do Ecad, ele arranca gargalhadas da platéia: "Quando precisamos ter um representante no Conselho Nacional de Direitos Autorais (CNDA), o presidente Ernesto Geisel nomeou Roberto Carlos, o que é um drama".
Joyce lembra quando esteve no CNDA, entre os substitutos do Rei, "que era nosso representante e nunca foi lá": "Havia os advogados do "bem" e os da "hidra". O conselho tinha sua função, conquistou várias coisas para nós".
Guimarães comenta o presente, entre otimista e pessimista: "Para mim é gratificante, 30 anos depois, ver a classe tocando na ferida, apesar de ver também como estamos desorganizados".
Eis outra senha: a desarticulação entre os diversos ambientes da música nacional está na boca de todos os participantes. Aparece quando Abel Silva chama o sindicato de "defunto morto, que fede" e quando Dalmo Mota retruca que ele nunca foi ao sindicato. Aparece nas várias referências à desacreditada Ordem dos Músicos do Brasil, que tem um mesmo dirigente há quase 40 anos.
Aparece no resmungo de Tibério Gaspar, de que "o MinC traçou o plano por nós", e no truco de Fernanda Abreu, de que "a gente não traça nada". É ela também quem se irrita com os reclames de Abel Silva contra o sindicato: "Se você quiser acabar com o sindicato, a hora é agora".
Quem tenta afinar todos os instrumentos é Egeu Laus, atuante no Fórum Carioca de Música, que brinca que é designer, e não músico. Ele ataca a resistência de vários dos presentes em aceitar a presença da hidra de cinco cabeças na câmara setorial: "Interesses classistas não vêm ao caso. Todo mundo tem que ser obrigado a sentar na mesma mesa e se encarar. Se não for assim o mais poderoso faz seu lobby e vence tudo".
Pois um novo e grande lobby tenta se formar; São Paulo segue de perto a aceleração dos acontecimentos no Rio. "É igual a um estopim, já há mobilizações importantes aqui, em Brasília, no Pará. Não me lembro de ter presenciado algo assim em meus 45 anos", avalia o músico Juca Novaes.
O panorama soma hesitações, desconfianças, descobertas, mas, como diria Vinicius de Moraes, abriu-se a porta da arca de Noé.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)



De: "Cristina Saraiva"
Data: Seg Nov 1, 2004 10:23 am
Assunto: Folha de São PAulo , hoje

Classe ensaia mobilização inédita em reação a proposta do MinC de criar câmara setorial

A música se levanta
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

A voz grave de locutor de rádio ou cinemão à moda antiga se abre ao microfone, anuncia que vai começar o espetáculo. Poderia ser um auditório de fãzocas da dourada Rádio Nacional, uma assembléia estudantil tipo anos 60 ou um culto religioso em qualquer época e lugar -mas nada disso. O "locutor" se chama Ivan Lins e está no palco da casa carioca de jazz Mistura Fina para anunciar um levante na música brasileira. É dia 28 de outubro de 2004.
As tentativas de reorganização da classe musical, no Rio, vêm se acelerando desde o ano passado, no âmbito do Fórum Carioca de Música. Em São Paulo, partem de fóruns e cooperativas ainda pequenas e isoladas. Agora todas se afunilam por causa da proposição, pelo Ministério da Cultura (MinC) do também músico Gilberto Gil, da criação de uma série de câmaras setoriais para a cultura -entre elas a de música.
A idéia foi importada do Ministério da Indústria e Comércio, que costuma manter grupos de discussão e trabalho abrangendo todos os elos de cadeias produtivas de diversos setores -"para soja, para porco, para suíno", exemplifica o violonista Dalmo Mota, representante do Sindicato de Músicos do Rio de Janeiro no concerto e um dos condutores da nova mobilização.
A platéia de cerca de cem pessoas do Mistura Fina está em polvorosa. Divide-se acaloradamente entre aplausos e vaias remetidos ao governo federal, ao ministro-cantor, ao representante do sindicato ("Não conheço você, nunca ouvi falar, conheço líder estudantil de longe, você não me representa", brada o compositor Abel Silva, encarnando o contra-tudo-e-contra-todos).
Vários se colocam contra a participação de outros elos da cadeia musical na câmara setorial. Tibério Gaspar, veterano co-autor do hino vencedor de festival "BR-3" (70), cunha o termo "hidra" (que virará moda e mania ao longo da reunião-show) para definir os inimigos em comum -além do governo, um monstro à parte.
O bicho de cinco cabeças, segundo ele, solda gravadoras, editoras, TVs, rádios e empresários musicais. Esquece-se de que os próprios músicos, compositores, intérpretes e letristas formam a sexta cabeçorra do monstro. "Somos muito fortes, somos milhares, mas não temos consciência de classe. Esse é que é o perigo", (auto)critica Tibério, quase encontrando a sexta cabeça.
Em meio à balbúrdia de bichos diversos numa arca de Noé, discursos dos chefes de chapa vão tentando clarear o panorama. A plenária aos poucos absorve a retórica de que é preciso forjar a impressão de uma classe unida e apresentar propostas concretas no próximo encontro com o ministro, marcado para esta quinta-feira, no Rio.
O comissariado, em forma de quinteto sem cordas, é constituído por Dalmo Mota, pelos históricos Francis Hime e Ivan Lins ("Dalmo é um grande violonista", ele tenta salvar mais tarde), por Cristina Saraiva (que se autodefine "letrista e artista desconhecida") e por Ana Terra, co-autora, com Angela Ro Ro, de "Amor, Meu Grande Amor" (79).
Se, em reunião anterior, na casa de Hime, compareceram espectadores-atores mais ou menos jovens, como Frejat, Zélia Duncan e Pedro Luís, desta vez o predomínio é da velha guarda da combalida MPB, no meio da qual bóiam meio perdidos militantes egressos da música erudita ou do pop dos anos 90 (como o radiofônico Jorge Vercilo) e 80 (Fernanda Abreu). A ex-backing vocal da Blitz provoca: "Chamei um monte de gente, DJ Marlboro, MV Bill, Paula Toller, não vieram. Cadê os "conscientes'? Cadê MV Bill, Paralamas, Titãs, Kid Abelha? Cadê o Lobão?".
Lobão, notório rebelde com várias causas, estava viajando, mas promete que vai aparecer nas próximas reuniões.
Entre emepebistas históricos como Marcos Valle, João Bosco e Carlos Lyra e uma pequena legião de operários da música, nota-se a ausência quase total de figurões da dita linha de frente da música nacional. Cristina Saraiva tomou a iniciativa de manter informado por fax o outrora participante Chico Buarque, colega dela nos jogos de futebol. Maria Bethânia mandou avisar que não tem muita paciência para essas coisas, Caetano Veloso está cantando no Primeiro Mundo.
Até o momento ainda não deram as caras bichos tão diversificados quanto militantes de samba de raiz, movimento hip hop, funk carioca, axé music, canção sertaneja (afora Sérgio Reis, atuante no grupo paulistano, que tenta seguir de perto o carioca com intensas e intensivas reuniões).
Quem organiza o movimento e orienta o Carnaval, por enquanto, são artistas com quem o grande público não tem familiaridade, como Cristina e Dalmo no Rio e Carlinhos Antunes e Juca Novaes em São Paulo.
Mas, nas duas cidades, a voz mais forte tem sido a de Ivan Lins, que freqüentemente adota um discurso de tomada de responsabilidade, mais proposta e menos reclamação.
Quando o maestro Antonio Adolfo, o outro co-autor de "BR-3", reclama do que virou o Ecad (Escritório Central de Arrecadação de Direitos), Ana Terra retruca: "Virou por quê? Porque nós deixamos". E Ivan carimba: "A culpa é nossa".
Ele toma gosto pela coisa e adquire ares de chefe popular, às vezes quase messiânico/populista. Eis algumas de suas palavras de ordem: "O governo considera a cultura um subproduto", "a classe política não é confiável", "sou privilegiado, podia estar em casa assistindo vocês fazerem, mas quero colocar todo meu prestígio, me jogar de cabeça nisso", "quero sentar frente a frente com o pessoal do jabá, ouvir eles dizerem na minha cara que não pagam jabá", enfim "talvez esta seja a grande missão da minha vida".
Mas Ivan acaba por expor também sua própria classe, comumente associada a fama, glamour, riqueza e futilidade: "Precisamos discutir a céu aberto, para que a comunidade saiba que viver de música não é tão fácil assim. A comunidade não sabe nada sobre jabá, sobre direitos autorais, sobre pirataria".
Adiante, se refere à desunião de seus pares: "Às vezes um tenta chutar o balde, mas outros dois dão para trás, com a desculpa de que "ah, eu estava lá tocando bem no rádio, ia me prejudicar" ". Como Ivan bem sabe, os que tocam bem no rádio por enquanto continuam guardados em casa contando o vil metal.
Hime, parceiro histórico do politizado Chico Buarque, admite que a classe se inspira no burburinho propagado a partir da fauna cinematográfica e da polêmica proposta de criação da Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinav).
Sublinha discurso propositivo, mas também independente. "Os músicos são sempre acusados de não se mobilizarem, esta é uma oportunidade histórica dada pela presença de Gil no governo" mas também, "se for o caso de criar uma agência lá na frente, que seja de preferência independente do governo; quem vai criar políticas somos nós, é a classe musical".
Cristina Saraiva toca no mesmo assunto: "Quando rolou a história da Ancinav, me perguntei por que a gente também não tem uma agência. O cinema está organizado, na música não temos política nenhuma. Precisamos dar finalmente uma mostra de maturidade política, que vai depender da nossa capacidade de construção coletiva".
E ela completa, ecoando o medo e a desconfiança subjacentes em muitos dos discursos: "O mais importante é que a gente se organize, se estamos organizados e unidos não há como o governo passar rasteira".